O inútil disfarce e a verdadeira vida cristã

A propósito da Campanha da Fraternidade do ano de 2015, cujo importante tema é “Fraternidade: Igreja e Sociedade” e lema “Eu vim para servir” (Mc 10,45), são dignas de toda atenção as seguintes palavras do Beato Papa Paulo VI:
Urge confirmarmo-nos nestas convicções, para fugir a outro perigo que o desejo de reforma1 poderia originar, não tanto em nós, Pastores, defendidos por um vigilante sentido de responsabilidade, quanto na opinião de muitos fiéis. Pensam estes que a renovação da Igreja deve consistir principalmente na adaptação dos seus sentimentos e costumes aos do mundo. A fascinação da vida profana é hoje violentíssima. O conformismo parece a muitos necessário e justificado. Quem não está bem firme na fé e na prática da lei eclesiástica, facilmente pensará ter chegado o momento de nos adaptarmos à concepção profana da vida, como se esta fosse a melhor, a que o cristão pode e deve tomar para si. Fenômeno de adaptação que se manifesta no campo filosófico (...) e que se apresenta também no campo prático, em que se torna cada dia mais incerto e difícil marcar a linha da retidão moral.

O naturalismo ameaça esvaziar a noção original da mensagem cristã. O relativismo, tudo justificando, e afirmando que tudo é do mesmo valor, impugna o caráter absoluto dos princípios cristãos. O hábito de excluir qualquer esforço, qualquer incômodo, da prática ordinária da vida, acusa de inutilidade enfadonha a disciplina e a ascese2 cristã. Às vezes, até o desejo apostólico de entrar em ambientes profanos e de conseguir boa aceitação nos espíritos modernos sobretudo juvenis, traduz-se em renúncia às formas próprias da vida cristã e mesmo àquele estilo de domínio próprio, que deve dar sentido e vigor ao desejo de aproximação e de influxo para o bem. Não é verdade, porventura, que muitas vezes o Clero novo, ou até alguns Religiosos zelantes, guiados pela boa intenção de penetrar nas massas populares e noutros meios, procuram confundir-se em vez de distinguir-se, renunciando assim com inútil mimetismo à eficácia genuína do seu apostolado? O grande princípio, enunciado por Cristo, volta a apresentar-se na sua atualidade e também na sua dificuldade: estar no mundo, mas não ser do mundo. Felizes de nós porque a altíssima e oportuníssima oração, daquele "que sempre vive para interceder por nós" (Hb 7,25), ainda hoje é repetida diante do Pai do céu: "Não peço que os tires do mundo, mas que os defendas do mal" (Jo 17,15).

1. Era o tempo do Concílio Vaticano II
2. Ascese: penitência, desapego dos bens e do prazer terrenos


(Trecho da Encíclica Ecclesiam Suam, de 06/08/1964)